Mesmo com falta de efetivo, Polícia Civil tem investigadores e delegados cedidos
15/12/2025
(Foto: Reprodução) Palácio Araguaia e Tribunal de Justiça do Tocantins
Carlos Eller - Governo do Tocantins/ Vilma Nascimento - g1
O governo do Tocantins renovou a cessão de pelo menos 390 servidores públicos para outros poderes e órgãos da administração pública. A maioria está atuando no Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO), mas há servidores cedidos para municípios, para a União e até outros estados. A Secretaria de Segurança Pública (SSP), mesmo com déficit de profissionais, cedeu ao menos 16 investigadores de polícia e dois delegados da Polícia Civil.
Segundo as portarias, publicadas no Diário Oficial do Estado, nos dias 27 e 28 de novembro, 1º e 2 de dezembro, os servidores já estavam cedidos e o governo decidiu manter as cessões por mais um ano, de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2026. Outras sessões foram publicadas no início de dezembro.
Entre os profissionais estão centenas de assistentes administrativos, fisioterapeutas, psicólogos e professores, entre várias outras áreas de atuação.
O governo do Tocantins afirmou, em nota, que a cessão de servidores é um "procedimento previsto em lei e adotado em todo o país", que busca fortalecer a cooperação entre as instituições públicas e aprimorar a prestação de serviços à população. Mesmo questionado, o governo não informou quantos servidores estaduais estão cedidos atualmente, mas disse que: "Quando a cessão do servidor solicitado implicar em déficit de pessoal, o órgão se manifesta formalmente, inviabilizando a cessão" (veja nota completa abaixo).
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Foram cedidos profissionais de diversos setores, como do próprio Executivo, das secretarias de Segurança Pública, Saúde, Educação, Cidadania e Justiça, Agência de Defesa Agropecuária (Adapec), Universidade Estadual do Tocantins (Unitins) e Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins). A Polícia Militar também cedeu militares.
O TJTO foi o que mais recebeu servidores. Entre os profissionais cedidos ao judiciário estão assistentes administrativos, investigadores de polícia, um delegado, fiscal defesa agropecuária, técnico de laboratório, fiscal ambiental, operadores de computador e até auxiliares de serviços gerais.
O TJTO afirmou, em nota, que não houve um aumento no quantitativo de servidores cedidos. Também afirmou que "profissionais com formações diversas contribuem para que o Judiciário funcione de maneira plena, segura e eficiente, em benefício da sociedade" (veja nota completa abaixo).
O advogado especialista em direito público Gustavo Silva Santos explica que a cessão de servidores públicos é prevista na legislação, "mas, em larga escala, pode comprometer a eficiência do serviço público".
"A Constituição Federal (art. 37, caput) impõe à Administração Pública os princípios da eficiência e continuidade do serviço público. Quando muitos servidores são cedidos, há risco de desfalque funcional, o que pode comprometer as atividades finalísticas do órgão cedente".
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Servidores cedidos mesmo com déficit de pessoal
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A Secretaria de Segurança Pública (SSP) cedeu 15 oficiais investigadores de polícia e até um delegado de polícia para o TJTO. Também cedeu um investigador para a Prefeitura de Palmas e outro delegado para o Estado de Rondônia.
Em contrapartida, em julho de 2025, o Ministério Público do Tocantins (MPTO) apontou que há um déficit de 1.272 policiais civis, sendo 97 delegados, 1.016 oficiais investigadores, 27 agentes de necrotomia e 132 peritos.
No início de novembro, a falta de efetivo voltou a ganhar destaque depois que a própria Justiça determinou que o governo reponha o efetivo da delegacia de Alvorada, que chegou a deixar investigações prescreverem por falta de pessoal.
A SSP afirmou, em nota, que os servidores cedidos "são direcionados para atividades que contribuem diretamente para o fortalecimento da inteligência institucional e segurança dos órgãos cessionários, sem qualquer prejuízo às atividades operacionais da Polícia Civil" (veja nota completa abaixo).
Entretanto, o especialista explica que quando um órgão cede um número significativo de servidores é preciso encontrar alternativas para suprir a demanda, como:
Redistribuir as atribuições entre os servidores remanescentes (o que pode sobrecarregá-los);
Realizar contratações temporárias, se a lei local permitir;
Solicitar autorização para realização de novo concurso público, se houver previsão orçamentária.
"Ou seja, há um impacto, e ele precisa ser avaliado caso a caso, tanto do ponto de vista jurídico quanto da gestão pública".
No caso da Polícia Civil, em que já há um déficit de profissionais, a cessão de servidores pode comprometer o atendimento à sociedade, tendo em vista que não é possível a contratação temporária de investigadores e delegados, por exemplo. A SSP afirmou que está avançando "nos trâmites para o lançamento do concurso público da Polícia Civil", mas não disse quando isso vai acontecer.
Servidores cedidos para o Estado de Goiás
O Diário Oficial de sexta-feira (28) trouxe a cessão de 23 servidores para o Estado de Goiás. Entre os cedidos estão assistentes administrativos, investigadores de polícia, engenheiros agrônomos, técnicos de enfermagem, enfermeiros, farmacêuticos, policiais penais, entre outros.
Neste mesmo dia, outras portarias cederam 36 servidores de diversas áreas para a Defensoria Pública do Tocantins (DPE). Também há servidores cedidos para órgãos da União e para o Estado de Rondônia.
Cessão não pode ser alternativa ao concurso público
A regra para ingressar no serviço público, segundo a Constituição Federal, é por meio de concurso público, salvo em cargos de livre nomeação e exoneração. O especialista destaca que a cessão de servidores não pode ser utilizada como alternativa para isso, por parte dos órgãos que recebem servidores cedidos.
"A Constituição Federal é clara ao exigir investidura em cargo ou emprego público mediante concurso público (art. 37, II). Se a cessão está sendo usada como meio de preencher cargos efetivos ou funções permanentes com servidores que não passaram por concurso específico para aquele órgão ou carreira, pode-se interpretar que há burla ao princípio do concurso público."
Essa situação, inclusive, pode ser objeto de análise por órgãos de controle como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público, que consideram irregular a cessão de servidores para ocupação de funções típicas de cargos efetivos no órgão de destino.
"A cessão deve ser excepcional, temporária e motivada por interesse público devidamente justificado, não podendo servir como atalho para o preenchimento de lacunas funcionais permanentes, sem concurso", explica.
Veja íntegra das notas
Governo do Tocantins
O Governo do Tocantins esclarece que a cessão de servidores a outros Poderes e instituições públicas é um procedimento previsto em lei e adotado em todo o país como forma de assegurar o pleno funcionamento da administração pública.
A medida ocorre quando órgãos parceiros demandam profissionais com formações específicas ou experiência técnica necessária para atender atividades de interesse coletivo, garantindo eficiência, continuidade de serviços essenciais e otimização dos recursos humanos disponíveis no Estado.
As cessões são realizadas mediante solicitação formal do chefe do Poder ou órgão interessado para a execução de atividades do solicitante, e autorização conforme as normas vigentes, sem prejuízo às atividades de origem dos servidores. Quando a cessão do servidor solicitado implicar em déficit de pessoal, o órgão se manifesta formalmente, inviabilizando a cessão. O objetivo é fortalecer a cooperação entre as instituições públicas, aprimorar a prestação de serviços à população e assegurar que as estruturas administrativas funcionem de maneira integrada, responsável e transparente.
Tribunal de Justiça do Tocantins
O Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO) informa que as portarias mencionadas pelo veículo, em sua maioria, renovam cessões de servidores em exercício no Poder Judiciário. Não há, portanto, aumento do quantitativo atual. Essas renovações observam os parâmetros estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para servidores cedidos.
As cessões ocorrem por meio de convênios e outros instrumentos de cooperação institucional, com a anuência expressa dos órgãos, voltadas à melhoria da prestação de serviços ao cidadão.
O Poder Judiciário possui uma estrutura abrangente, que inclui apoio técnico, saúde ocupacional, gestão administrativa, segurança institucional, entre outros. Profissionais com formações diversas contribuem para que o Judiciário funcione de maneira plena, segura e eficiente, em benefício da sociedade.
Em relação aos concursos públicos, os servidores cedidos permanecem vinculados ao quadro de origem e não ocupam cargos efetivos do TJTO, razão pela qual não substituem vagas destinadas a concurso. As orientações do CNJ tratam do quadro próprio de servidores do Tribunal, tema que está dentro do planejamento institucional e orçamentário. Quando houver definição e cronograma, essas informações serão divulgadas pelos canais oficiais de comunicação do TJ.
Secretaria de Segurança Pública
A Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP/TO) informa que as cessões citadas se referem a servidores que são direcionados para atividades que contribuem diretamente para o fortalecimento da inteligência institucional e segurança dos órgãos cessionários, sem qualquer prejuízo às atividades operacionais da Polícia Civil.
A medida é prevista em lei e decorre de requisições formais entre os Poderes, prática institucional consolidada em todo o país e que visa garantir o funcionamento de serviços essenciais que dependem de apoio técnico especializado.
Sobre o concurso público, o Governo do Tocantins avança nos trâmites para o lançamento do concurso público da Polícia Civil, que contemplará diversas carreiras e contribuirá para a recomposição do efetivo, atendendo ao planejamento estratégico de expansão e modernização da Segurança Pública.
A SSP/TO reafirma seu compromisso com a responsabilidade institucional, com o equilíbrio administrativo entre os Poderes e, sobretudo, com a melhoria contínua dos serviços prestados à população tocantinense.
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